Imigrantes italianos, pioneiros da exibição cinematográfica brasileira: Irmãos Paschoal, Afonso e Gaetano Segreto

Por Antonio Ricardo Soriano

Paschoal Segreto (Pascoale Segreto – 1868-1920)

Paschoal Segreto foi o primeiro grande empresário do entretenimento e o primeiro exibidor e produtor de filmes no Brasil.



Paschoal nasceu, em 22 de março de 1868, na cidade de San Martin di Cileno, na província italiana de Salerno, filho de Domenico e Concetta Segreto. Aos 15 anos, em 1883, decidiu imigrar para o Brasil, junto ao seu irmão Gaetano (dois anos mais velho), embarcando na 3ª classe do navio a vapor “Savoie” para o Rio de Janeiro. Lá, trabalharam vendendo bilhetes de loteria e jornais. Logo, por terem grande facilidade para os negócios, passaram a explorar as primeiras formas de divertimento na cidade, como jogos, apostas e loterias (consideradas contravenção), levando eles a algumas passagens pela Casa de Detenção. Quando estavam bem estabelecidos, trouxeram em 1896, o outro irmão Afonso Segreto para ajudar nos negócios.

Paschoal observou, no Rio de Janeiro, o surgimento de cabarés, cafés-concerto e salões, onde se ofereciam vários tipos de espetáculos de variedades e com diversos artistas. Junto, haviam sempre algumas novidades mecânicas, como o Fonógrafo e o Cinematógrafo. Com imensa vontade e criatividade em trabalhar no ramo das diversões, Paschoal fundou a primeira empresa de porte e de nome nacional do setor, a Empresa Paschoal Segreto.

Primeira sala a manter uma programação contínua de exibição cinematográfica no país
Observando o sucesso das exibições irregulares do Cinematógrafo na cidade, em 31 de julho de 1897, Paschoal e José Roberto Cunha Salles realizaram a inauguração solene da primeira sala a manter uma programação contínua de exibição cinematográfica, o Salão de Novidades Paris no Rio (Rua do Ouvidor, nº 141), com a impressionante presença de 1.572 pessoas. Ao lado de bonecos automáticos, caça-níqueis, bibelôs excêntricos, números de variedades e aparelhos de entretenimento científico, o “Salão Paris no Rio” exibia também o Cinematógrafo Lumière.

“Paris no Rio – Salão de Novidades – De Salles e Segreto – 141 Rua do Ouvidor – No dia primeiro foi inaugurado ao público esse luxuoso salão com a exibição de maravilhosos quadros de fotografias animadas, reproduzidas pela importante máquina Vitoscópio – Super – Lumière, a primeira até hoje vinda à América do Sul. Sessão todos os dias e todas as noites. Entrada 1$000.” – Cidade do Rio, 4 de agosto de 1897.

Com a repercussão da inauguração do “Salão”, que rendeu várias notas nos jornais e levou a formação de enormes filas nos dias de exibição, o então Presidente da República, Prudente de Moraes fez questão de comparecer com a família para conhecer a nova atração do italiano, em 17 de junho de 1898.

O sucesso do “Salão” se firma de tal modo que, para atender à crescente demanda de novos filmes, partiram emissários para os Estados Unidos e Europa a fim de adquirir novas ‘vistas’. Afonso Segreto, afirmou-se na função, além disso, aprendeu a usar novos equipamentos cinematográficos. A 19 de junho de 1898, Afonso regressou de uma de suas viagens co­merciais e trouxe consigo uma câmara de filmar. Ainda a bordo do paquete francês Brèsil, ele produziu algumas vistas da baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, sendo esta, uma das primeiras filmagens produzidas no Brasil.

Em 9 de setembro de 1897 foi desfeita a sociedade Segreto & Salles. Paschoal continuou com o “Salão”, tendo como novo sócio o irmão Gaetano. Um incêndio destruiu por completo o “Salão”, em agosto de 1898, assim como o resto, os dois outros andares onde os Segreto guardavam equipamentos e moravam. No entanto, o prédio estava no seguro e Paschoal logo reabriu o “Salão” no mesmo local, em 5 de janeiro de 1899.

No dia 23 de dezembro do mesmo ano, inaugurou o Parque Fluminense, com um cinematógrafo ao ar livre e uma pista de patinação no gelo. Depois, abriu o Coliseu Boliche, o Maison Moderne, o Moulin Rouge (que reformou em 1904) e o High Life Club (na Rua Santo Amaro, no bairro da Glória). Arrendou teatros, como o São José, o São Pedro e o Carlos Gomes. Em todas as casas da empresa, o cinema era a atração central, mas não exclusiva. Em outras cidades, como Niterói, São Paulo e Santos, também controlou várias casas de espetáculos e jogos.

Paschoal, também, foi o primeiro exibidor de fitas nacionais. Em relação às outras exibições cinematográficas que ocorriam irregularmente no Rio de Janeiro, por outros empresários, Paschoal passou a ter um diferencial em suas casas de espetáculos e variedades, onde o cinema era a principal atração, os “filmes locais” produzidos por seu irmão Afonso, ajudando a se consolidar como o primeiro grande empresário de entretenimento e responsável pela introdução do cinema no país, sendo cognominado pela imprensa como o “Ministro das Diversões”.

Em 1900, os irmãos Paschoal e Afonso, montaram um estúdio para a produção de filmagens de acontecimentos bem recentes e um laboratório próprio. Qualquer acontecimento (paradas militares, incêndios, manifestações, etc.) era projetado, dias depois, no “Salão Paris no Rio”. Até 1907, a Empresa se manteve como única exibidora e produtora de cinema no país.

A partir de 1908, com o surgimento e o aumento da concorrência, Paschoal passou a importar e produzir “filmes alegres”. Inaugurou o Pavilhão Internacional, na Avenida Central, atual Avenida Rio Branco, trazendo para junto do Cinematógrafo, a apresentação de artistas internacionais.

Com o surgimento da gigante “Companhia Cinematográfica Brasileira”, de Francisco Serrador, que foi se apossando do mercado cinematográfico paulista e depois do carioca, Paschoal se manteve no setor apenas como um pequeno exibidor, enquanto continuou empresariando entretenimentos variados.

Enriqueceu, trazendo para o teatro seus conceitos de entretenimento a preços populares. Sua contribuição para a formação de um teatro musical e cômico nacional, o Teatro de Revista, foi muito importante, tanto que Procópio Ferreira lhe chamou de “Papa do teatro brasileiro”.

Em 1919, trouxe para o centenário da cidade de Niterói, uma novidade do exterior, o Carrossel.
Morou com sua esposa Carmela no bairro carioca de Santa Teresa, com quem não teve filhos. Faleceu em 27 de fevereiro de 1920, devido agravamento de gangrena, decorrente da diabetes. Encontra-se sepultado no Cemitério São João Batista.

Afonso Segreto (Alfonso Segreto – 1875 - ?)

Por orientação de seu irmão Paschoal tornou-se o primeiro cineasta brasileiro, realizando, entre 1898 e 1901, cerca de 60 filmes, que constituem a maioria absoluta das primeiras filmagens produzidas no país.



Existem poucas informações sobre Afonso. Sabemos que, em 1896, foi trazido da Itália para o Rio de Janeiro, pelos seus irmãos Paschoal e *Gaetano, quando estes se consolidaram comercialmente no ramo dos jogos e diversões. Provavelmente, nasceu na mesma cidade dos irmãos, em San Martin di Cileno, na metade da década de 1870.

Primeiras filmagens no Brasil
No Rio de Janeiro, passou a trabalhar na Empresa Paschoal Segreto. Participou do lançamento do Salão de Novidades Paris no Rio. Em janeiro de 1898, viajou à Nova York, onde adquiriu novas fitas para a programação do “Salão” e, também, comprou e aprendeu a operar novos equipamentos de filmagem e projeção. Depois, em Paris, realizou um estágio na Pathé Films. Voltou para o Brasil e no dia de sua chegada, em 19 de junho de 1898, Afonso filmou, a bordo do navio francês Brèsil, a cidade do Rio de Janeiro em pleno amanhecer e, depois, as fortalezas e navios de guerra na baía de Guanabara, sendo estas, umas das primeiras filmagens ou “vistas” feitas no Brasil. Pesquisas apontaram o italiano Vittorio di Maio como o verdadeiro realizador das primeiras filmagens produzidas no país. Mesmo assim, o dia 19 de junho é considerado o Dia do Cinema Brasileiro.

Depois, Afonso seguiu filmando por muitos anos, no Rio, solenidades e acontecimentos políticos e sociais, como o terceiro aniversário da morte do Marechal Floriano Peixoto, o desembarque do Presidente Prudente de Morais e sua comitiva no Arsenal da Marinha e visitas de personalidades e autoridades de outros países, fazendo parte da política de boa vizinhança que o irmão Paschoal possuía com as elites do país.

Em 23 de fevereiro de 1899, Afonso chegou de Nova York com novos aparelhos de exibição cinematográfica (para substituir os equipamentos perdidos no incêndio do “Salão Paris no Rio”), sendo festivamente recebido por seu irmão Gaetano e pela diretoria do Círculo Operário Italiano, com fogueteiro, banda de música e um almoço especial. No mesmo ano, Afonso viajou com Gaetano até São Paulo, para uma reunião do Círculo Operário Italiano paulista, quando realizou a primeira filmagem na capital paulista, no dia 20 de setembro de 1899, aniversário da unificação da Itália. “Círculo Operário Italiano em São Paulo” é exibido, dias depois, no “Salão de Novidades Paris no Rio”.

Por causa de discussões e desacordos políticos com seu irmão Paschoal, devido a seus filmes feitos com bastante independência, Afonso foi afastado da Empresa Paschoal Segreto. Em 1902, a Empresa apresentou um único filme, “Vistas Nacionais” (com o reaproveitamento de filmagens de Afonso), paralisando suas atividades cinematográficas até 1907.

Depois de uma temporada em São Paulo, à frente de um ateliê fotográfico, Afonso retornou à Itália, onde morreu quase anonimamente.

* Gaetano Segreto continuou trabalhando com a distribuição de jornais e se envolveu cada vez mais com a colônia italiana no Rio de Janeiro, tornando-se membro e depois dirigente de diversas associações, como o Círculo Operário Italiano carioca. Tornou-se editor do “Il Bersagliere”, um jornal publicado no Rio, em Italiano. Casou-se, em 1896, com Elia Saccardi, que lhe deu dez filhos. Gaetano morreu na Itália, em 22 de junho de 1908, perto de sua cidade natal, onde foi enterrado, deixando nove filhos, que passaram a ser criados pelo irmão Paschoal.

Fontes de pesquisa:
Livro "Salões, Circos e Cinemas de São Paulo", de Vicente de Paula Araújo - Ed. Perspectiva - 1981.
Livro “Enciclopédia do cinema brasileiro” - Organizadores: Fernão Pessoa Ramos e Luiz Felipe A. de Miranda - Ed. Senac São Paulo - 2004.
Revista “Nossa História - Ano 2 - nº 13 - Novembro/2004” - Artigo “O ministro das Diversões”, de William Martins.
Site da Cinemateca Brasileira (www.cinemateca.gov.br).

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BIBLIOGRAFIA DO SITE

PRINCIPAIS FONTES DE PESQUISA

1. Arquivos institucionais e privados

Bibliotecas da Cinemateca Brasileira, FAAP - Fundação Armando Alvares Penteado e Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - Mackenzie.

2. Principais publicações

Acervo digital dos jornais Correio de São Paulo, Correio Paulistano, O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo.

Acervo digital dos periódicos A Cigarra, Cine-Reporter e Cinearte.

Site Arquivo Histórico de São Paulo - Inventário dos Espaços de Sociabilidade Cinematográfica na Cidade de São Paulo: 1895-1929, de José Inácio de Melo Souza.

Periódico Acrópole (1938 a 1971)

Livro Salões, Circos e Cinemas de São Paulo, de Vicente de Paula Araújo - Ed. Perspectiva - 1981

Livro Salas de Cinema em São Paulo, de Inimá Simões - PW/Secretaria Municipal de Cultura/Secretaria de Estado da Cultura - 1990

Site Novo Milênio, de Santos - SP
www.novomilenio.inf.br/santos

FONTES DE IMAGEM

Periódico Acrópole - Fotógrafos: José Moscardi, Leon Liberman, P. C. Scheier e Zanella.

Fotos exclusivas com publicação autorizada no site dos acervos particulares de Joel La Laina Sene, Caio Quintino,
Luiz Carlos Pereira da Silva e Ivany Cury.

PRINCIPAIS COLABORADORES

Luiz Carlos Pereira da Silva e João Luiz Vieira.

OUTRAS FONTES: INDICADAS NAS POSTAGENS.